ESCREVER É DIVINO!

ESCREVER É DIVINO!
BONS TEMPOS EM QUE A GENTE PODIA VOAR. ERA MUITO BOM SER PASSARINHO.

CAMINHOS DE UM POETA

CAMINHOS DE UM POETA
Como é bom, rejuvenescedor e incentivador para o poeta, poder olhar para trás e ver toda a sua caminhada literária, lembrar das dificuldades, dos incentivos e da falta deles, da solidão de ser poeta e do diferencial que é ser poeta. Olhar para trás e ver tudo que semeou, ver uma estrada florida de poesias, e dizer: VALEU A PENA! O poeta vai vivendo, ponteando, oscilando, e nem se dá conta da bela estrada que escreveu. Talvez ele não tenha tempo porque o horizonte o chama, e o seu norte é... escrever... escrever... escrever. Olho hoje para trás... não foi fácil, mas também ninguém disse que seria. E eu sabia que não seria, ser poeta não é fácil, embora seja lindo. Contemplo a estrada que eu fiz, e digo com orgulho quase narcisista: Puxa... como é linda minha estrada!

quarta-feira, 14 de janeiro de 2009

O DIA EM QUE FUI CONDENADO


De onde estava, pude ouvir rumores de uma pequena multidão. Pareciam esperar alguma espécie de comemoração, estavam alvoroçados. De sandálias franciscanas pude sentir o chão molhado. O lugar fedia. Eu tinha os olhos vendados, as mãos amarradas para trás. Tentei ouvir alguém próximo de mim, mas estava só. Com o corpo fui tentando descobrir onde estava. Pelo pouco espaço disponível senti que o cubículo parecia uma cela. Fui encostando, me esfregando sem camisa e pude sentir paredes ásperas, mal acabadas, até que esbarrei em barras de ferro. Sim, era um cela. Mas o que eu fazia ali? O que eu teria feito que não me lembrava? Gritei várias vezes: “Tem alguém aí?. Socorro! Por favor, alguém pode dizer por que estou aqui?”. Nada. Só o eco respondia por aqueles corredores. Agachei-me, tive vontade de chorar. Levantei. “Não, chorar não. Chorar é para momentos felizes, emocionantes”. Momentos difíceis é hora de lutar. Mas lutar contra quem ou o quê? Gritei ainda várias vezes sem resposta. Não sei o que incomodava mais. As amarras que doíam cada vez mais que tentava me livrar, a venda nos olhos ou a falta de alguém para me explicar o que eu fazia ali. Muitos minutos depois, ouvi passos firmes, pesados. Pareciam dois. Ouvi barulho metálico como se fossem armaduras medievais. Barulho de chave abrindo a porta. Um disse: “Vamos. Está na hora”. Tiraram-me a venda. Eram mesmo soldados medievais. Olhei em volta, ao fundo... à frente. Eu estava numa masmorra escura e fétida. E foram me levando, um de cada lado. Perguntei desesperado: “Para onde vão me levar? Por que estou aqui? O que fiz?” Sem resposta, eram treinados para não falarem com presos. Preso, eu? “Por quê? Por quê?”. Perguntava insistentemente. No trajeto por aquele grande corredor olhei outras celas, mas todas vazias, pelo menos pareciam, pois estavam escuras. Subimos uma pequena escada. Quando chegamos a um grande pátio, o sol me cegou. Com dificuldade fui abrindo os olhos. Os soldados, brutos, praticamente me arrastavam. Ainda pude ver na torre da igreja o relógio marcando 08:00h... sabe-se lá de que dia. Mas agora também não importava, pois vi que eu era um condenado. Eu ia morrer. Só não sabia por quê. A pequena multidão quando me viu apupou, deu vivas, gritos diversos e assobios. Me levaram por fora, por uma passarela separada por um alambrado, até o patíbulo. No centro dele, um mastro e uma corda... uma corda esperando um pescoço. Ou mais um. Numa velha cerca do lado direito, os abutres. Até os abutres sabiam do que ia acontecer. Tudo parecia combinado e já iam disputar cada pedaço de minha carne. Minhas mãos que tantas coisas boas escreveram. Meus olhos que tantas coisas lindas viram. Meu cérebro. Meu coração. Os soldados se afastaram. O carrasco, homem sinistro, vestindo roupas longas e negras, encapuzado, personificando a própria morte, se aproximou e disse com voz sombria: “Calma que vai dar tudo certo”. Certo pra quem? Para os que condenam? Um senhor de barbas longas, o chefe da execução, se aproximou também e disse: “Você pode fazer seu último pronunciamento, mas seja breve. Estamos atrasados”. Seus olhos frios me cortaram, me olhando de forma desprezível. Pediu silêncio com a mão à multidão presente e se afastou para o lado esquerdo. Pensei de novo em chorar. Chorar não. Não se deve chorar perante os inimigos. Deve-se chorar perante os amigos. Os amigos te abraçarão, os inimigos rirão.Respirei fundo. Então gritei bem alto, alto mesmo para me fazer ouvir para que pelo menos alguém da platéia pudesse me responder. “Vocês já me condenaram. Eu só queria saber o que foi que fiz?”. Silêncio total. Olhei para o lado esquerdo, o chefe acenou positivo com a cabeça para o carrasco. Ele colocou um capuz na minha cabeça. Fechei os olhos para receber o beijo da morte.
Quando senti a corda me roubando o ar e dobrando meu pescoço... ACORDEI! Que susto! Dei um pulo na cama. Reparei agora o relógio da parede, mas agora era do meu quarto. 08:00h também, mas na minha cama confortável. Tudo não passou de um pesadelo terrível. Minhas costas e rosto suados apesar do ventilador e da janela aberta. O sol me cegou de novo, mas agora era um sol amigo. Levantei-me, molhei os pulsos, o rosto, tomei água gelada e deitei-me um pouco de novo para que a respiração chegasse no lugar.
Tive esse pesadelo há muitos anos, mas jamais o esqueci porque me levou a uma reflexão.
Quantas vezes condenamos as pessoas sem lhes dar ao menos um direito de explicação? Ou as condenamos por algo que também fazemos? Quantas vezes falamos mal de alguém que passa na rua? Quantas vezes não damos a alguém uma segunda chance e queremos para nós todas as chances possíveis? Às vezes gostamos de ser o chefe da execução e olhamos de forma desprezível a alguém angustiado que pede perdão. Às vezes, gostamos de ser o carrasco. Às vezes damos até a corda. E às vezes somos os abutres. As hienas que riem da desgraça alheia. É muito bom ser carrasco, mas péssimo ser condenado. “Não faças aos outros, o que não queres que te façam”.

Um comentário:

JOCENDIR CAMARGO disse...

É meu amigo, ACORDAR é o melhor que pode nos acontecer, afinal estamos vivos e isso já é um presente. Como disseste, nada como um dia após o outro com uma noite no meio e que os sonhos sejam, ao menos, uma lição de humanidade. Parabéns por suas escritas, smpre belas e profundas... Um bom final de semana ... um abraço.