Recordando mais um texto, em clima de natal.
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Uma de minhas qualidades é a memória, principalmente afetiva. Lembro-me de coisas de minha tenra idade que meus familiares e amigos mais velhos até se assustam com a riqueza de detalhes. E assim...como esquecer de Dona Maura? Lá em Ipatinga, cidade até então, pode-se dizer, começando a nascer, minha família foi a segunda a mudar-se para o bairro. A família de Dona Maura foi a primeira. Eu ainda era bebê de colo. Mas quem é Dona Maura? Uma negra, gorda demais, simpática, sorridente, com uma família tão numerosa como a nossa. E pobre também, mas nem por isso, menos feliz. Ah... e com uma voz afinadíssima. Como esquecer... ela batendo o pedal da velha máquina de costura, cantando...” como é que papai Noel, não se esquece de ninguém. Seja rico, seja pobre, o velhinho sempre vem...” . Logo ela tão pobre. Eu, com minha cabeça de poetinha ficava tentando entender e ficava até torcendo para que ela cantasse, não só essa, mas também... “se essa rua, se essa rua fosse minha, eu mandava, eu mandava ladrilhar...” ou “ o cravo brigou com a rosa, debaixo de uma sacada...”. Incrível o tom lírico-triste-romântico que ela impunha àquelas cantigas.
A casa dela era uma festa da garotada. Não bastassem os seus tantos filhos, entre eles, Jaiminho, meu amigo até hoje que anda sumido, mas não esquecido, a garotada espalhada, sentada no chão, assistindo desenho animado. Como esquecer o dia em que ela tentando passar no meio da gente disse: “Quantos meninos! Que meninada, bonita! Quem dera se fossem todos meus! Como esquecer, quando alguém lhe perguntava: “Puxa vida, Dona Maura, como a senhora aguenta todos esses pirralhos o dia todo aqui?”. E ela, com suas bochechas negras, rechonchudas e brilhantes, respondia: “Deixe os meninos. Que mal eles podem me fazer? São apenas crianças. Melhor uma casa bagunçada que uma casa vazia”.
Como esquecer dos doces que ela fazia. Quebra-queixo. Doce de mamão. Doce de cidreira. Adorava comprar jabuticaba que acabava num piscar de olhos. Eu lambia os beiços quando chegava sentindo cheirinho de alguma delícia. Fazia deliciosas comidas salgadas também. Quando alguém dizia que comer isso ou aquilo fazia mal ou era pecado, ela respondia na calma. “O mal é o que sai da boca do homem”.
Eu costumo dizer que o tempo é covarde, mas nas coisas do coração o tempo não me venceu, pois ainda guardo na memória essas passagens. Guardo tanto que voltei à velha casa de Dona Maura, agora mais velha, mais gorda, igualmente negra, igualmente pobre e igualmente feliz. Lá não mudou muita coisa. Algumas paredes sem reboco, umas flores na frente, portãozinho de madeira, o mesmo muro meio quebrado. A velha máquina de costura, encostada num canto, parece cantar sozinha... “se essa rua, se essa rua fosse minha...” Claro que as crianças não são as mesmas, mas a sala dela ainda está cheia. Agora são netos, bisnetos e outros meninos. Os antigos, de meu tempo, cresceram. Eu, talvez nem tanto, pois me vi ali sentado de novo no meio daquela meninada.
Abraçado a ela, perguntei-lhe se se lembrava de tudo aquilo e ela me soltou mais uma pérola: “Claro que me lembro. Vocês são meus eternos meninos”.
Se recordar é viver... hoje estou mais jovem e mais vivo.
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Carlos Soares de Oliveira 29/03/2008.
19 comentários:
Recordar é viver sim! É sentir tudo novamente! É voltar ao passado e fazer dele o presente por momentos.
Beijito.
Boas festas.
Meu amigo, voce fala cada coisa que me deixa com o queixo caido..."o tempo é covarde", é mesmo, ele é implacavel com a gente, com as coisas que a gente gosta, com as pessoas, mas ele pode tudo, mas nao apaga nossa memoria, ou melhor, até apaga algumas coisas, mas aquela essencia, aquele todo de bom, fica sempre, que linda alma a dona Maura, "melhor uma casa toda bagunçada do que uma casa vazia", ela me fez lembrar os Natais que por aqui eu tinha, onde minha avó, uma santa alma tambem, fazia questado de todo mundo reunido, aquela mesa longa, ela encabeçando e a familia toda em volta, hoje meu amigo, o que dói do Natal é justamente isso, a falta que ela faz na união da familia, cada um pro seu lado, o meu pai, que me lembro bem, a gente pequeno, doido pra comer aquelas comidas difetentes e coloridas do Natal, mas antes tinhmos que sobreviver a uma longa oração dele, minhã mãe, e tantos que já se foram,,,seu post se encaixou de alguma forma na minha vida,,,em lembranças...obrigado por mais essa...forte abraço meu querido...paz pra ti.
Vamos sim trazer para o presente todas as coisas boas do passado e deixar lá bem enterradinhas as coisas que nos fizeram mal.
Passando rapidinho para agradecer sua amizade e carinho, obrigado pelos comentarios carinhossos em meu blog.
Muita felicidade para vc e seu amor..
Bjos querido!
Amei a D. Maura!
Adoro uma casa movimentada.
Minha neta consegue bagunçar todos os comôdos da minha casa,aliás é dela também.Os bonecos dela vão parar dentro das panelas!E ainda diz que acabou de arrumar..
Um Feliz Natal querido conterrâneo. Bjs Edna
Que lembrança gostosa, e, com certeza, muito merecida!! São pessoas assim, muito especiais, que passam em nossas vidas nos deixando mais ricos e com sentimentos muito prazerosos. Eu tive uma pessoa que foi muito importante pra mim, seu nome era Vitalina Maria de Oliveira... E, que "pessoa" extraordinária e super simpática!! Nossa! Ela era demais da conta. Muito religiosa, pois tinha vindo de um convento de freiras (imagina só! rs), lá no Piauí (Teresina). Aaah, essa era a minha Vitinha! Onde tudo era pecado, onde uma simples novela era um evento com proporções espantosas... Ela, simplesmente, A-DO-RA-VA! Aaah, minha Vitinha... que não podia ver uma cobra, pois era coisa do diabo! Ah, pra quê??!! Pois, se passasse o tal bichinho, na TV, eu, prontamente, berrava por ela e lhe dizia que a novela já tinha começado, ou uma outra desculpa qualquer só para vê-la gritar e dizer que eu era “rruim”, que eu não iria para o Céu! Infelizmente, ela se tornara uma vítima de todas as nossas encarnações possíveis... Tadiiinha!
Ela era solteira e (com um agravante!) nuuuunca tinha namorado. Pura e casta... Uau!! Ajudava nas missas, do “Pa. Alberto”, aos domingos! Han,han! A encarnação era rigorosa... Ah, era um prato cheio, não é verdade?! Costurava pra fora, pois não era empregada e nem babá! Simplesmente, conheceu minha mãe, em Belém, por acaso, e um dia, sem ninguém esperar, apareceu lá em casa!! Aaah, minha vitinha, que usava cabelo de “luluzinha”. É, ela fazia uns “rococós” (três, na verdade) dois nas laterais, junto à testa, e, o terceiro, lá atrás. Era Hi-lá-ri-o!!!! rs Vc não imagina onde eu reinava, pois junto com o meu irmão, eu era o seu maior xodó! Tudo era Glorinha, fui como uma filha para ela! Mas, ao mesmo tempo, uma peste de levada. É, dei muito trabalho à Vitinha... Mas, também, fui a que mais lhe deu carinho!! E como. Eu estava sempre atrás dela. Adorava vê-la costurando: sua máquina, seus pedais, o banquinho... Ihhh, eu sempre fui muito curiosa e “mexilhona”.
Ai, ai... É, a minha casa no Grajaú era grande! Cabia muita gente, muito amor e carinho.
BONS TEMPOS, AMIGO! BONS TEMPOS!! ADOREI O SEU TEXTO, PRA VARIAR! DESCULPE, SE ME ALONGUEI... MAS FOI IRRESISTÍVEL!!
Beijos
Glória
Como é bom recordar, eu também tive uma negra em minha vida a "Dindinha Amélia", aliás ela era dindinha de todo mundo, hoje ela já não está no meu de nós, e por ironia morreu segurando a minha mão, sempre me lembro dela, atleticana doente, todas as vezes que o galo pedia ela falava que era macumba rsrsrsrs.
Recordar é viver mas a vezes dói.
Feliz Natal
Abração
Emocionei-me com a tua narrativa memorialista!
Boas Festas e
Abraço natalício
Adoro suas histórias e sempre lembro de alguma também.Minha memória para a infancia também é rica de detalhes e o que fiz ontem qse não lembro rs...Essa sua mãe preta lembrou-me tia Anastácia do Sítio do Pica-Pau Amarelo, a amorosidade, os quitutes e a sabedoria que tem a simplicidade.Quando a coisa é boa o tempo se renova na mesma história.São valores que pudera todos nós tivéssemos. Bjão
oi amigo Carlos,
olha quero desejar a você um lindo Natal e um 2010 cheio de Paz e Sabedoria...
obrigada pela amizade pelo blog...
Abraço
Priscila Lima
Recordar coisas boas, é trazer a felicidade pra junto da gente...
OI CARLOS
QUERO QUE SAIBA QUE ESTOU EMOCIONADA
LINDA HISTORIA.....GRANDE MULHERA A DONA MAURA....ISSO SIM E AMOR ....E AMOR E FELICIDADE....APRENDAM A VIVER
BEIJO DA PORTUGUESA
Que recoradaçoes boas menino!!
Vim te desejar um Feliz Natal e que tenhas muita PAZ!
Beijos meus.
P.S:A conexao caiu naquela noite...
Carlos, meu amigo sumido, essas lindas pessoas que fazem parte de nossa história de vida, valem mais do que qualquer outra coisa.
Dá um abraço nessa Perola negra por mim.
Abs
O Natal é um dia festivo e espero que o seu olhar possa estar voltado para uma festa maior, a festa do nascimento de Cristo, ou naquilo que você acreditar dentro de seu coração.
Que neste Natal você e sua família sintam mais forte ainda o significado da palavra amor, que traga raios de luz que iluminem o seu caminho e transformem o seu coração a cada dia, fazendo que você viva sempre com muita felicidade.
Feliz Natal
São estes os meus mais sinceros desejos.
Abraço
Carlos, esse ano foi muito bom para mim, principalmente pelo blog, atráves dele eu conheci muitas pessoas que se tornaram especiais para minm, e você meu amigo é uma delas, parei para pensar em muitas coisas que se passavam dentro de mim, e que eu não compreendia, e muitas vezes você me ajudou com as suas postagens, muitas vezes pareciam que estavam sendo escritas para mim.
Meu amigo que o seu natal seja maravilhoso, com muita paz, muito amor e com Deus em nossos corações.
olá Carlos
Passei para desejar a vc e sua família um lindo Natal, que esse ano de 2010 seja mágico, cheio de paz, realizações,saúde...tudo envolto com muito amor.
beijos
Sentirmos saudade, e recordarmos de fases boas de nossas vidas é fundamental, pois quem fica na memória de alguém não morre nunca..
Q seu Natal seja de mta paz e de mta luz..
Feliz Natal!!
Beijos e até já já!
Oi amigos. Ontem não pude responder como merecem. O poeta não está imune à corrreira de natal, mas fiquei contente de ver todos aqui.E cada um contando sua historinha de suas "Donas Mauras" da infância.Pois é.de vez em quando a vejo ainda.Um abraç oatodos
Olá Amado Poeta Amigo Nopsso,te abraçar aqui me trouxe,com os votos de um dia de Natal lindo,entre os que mais amas!
viva vida!
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