
É evidente que as crianças de hoje são diferentes das do meu tempo, acreditávamos em estórias de terror como, lobisomem, mula sem cabeça, etc, por isso fiz esse pequeno teste com meninos de hoje. Esse caso tem uns dez anos. Do lado de minha casa havia um lote vazio, os meninos fizeram até um campinho lá, inclusive eu brincava de vez em quando com eles. Noite sem lua, alguns postes apagados, o cenário ficou perfeito para meu plano. Fiz de uma abóbora uma cabeça de caveira com olhos e boca. Fiz um buraco em cima e pus uma vela acesa. Quem do meu tempo não fez isso um dia? O lote era sempre escuro, devido ao matagal, dividindo o espaço com o campinho. Coloquei a caveira sobre o muro, fiquei do lado de dentro, na escada esperando algum menino passar. De repente vi uns meninos, talvez vindo de alguma festinha, e me preparei, com o rosto atrás da caveira. Começaram a dizer baixinho. "Olha lá... que negócio esquisito. Parece que está pegando fogo". Outro. "Parece uma cara, uma bruxa". Mais um. "Coisa feia! Ai, meu Deus. O que é aquilo?". Ficaram do outro lado da rua agrupados. "Vamos lá perto?". Outro. "Tá doido? Eu vou é pra casa". Um mais esperto disse. "Seus medrosos. Tá parecendo mais é uma lanterna, uma tocha. Vou lá ver". Pegou umas pedras no chão e veio, os outros desconfiados, vieram atrás em passos indecisos, murmurando. Quando chegaram a uma meia distância, eu que tenho uma voz forte, soltei um urro enorme, agitando a caveira, e só vi meninos correndo apavorados, gritando, chorando, passando sobre os outros que caíam. Tive dó de um menorzinho que não teve forças pra correr tamanho foi o medo, chamando pela mãe. Menino em perigo sempre chama pela mãe. Pensei. "Coitado, deve ter feito xixi na calça". A vela acabou apagando por ter agitado tanto, eles ficaram lá longe na esquina ainda tentando entender. Levantei a cabeça sobre o muro e gritei. "Ô, cambada de 'oreia'. Sou eu, o Carlos". Vieram protestando. "É, né Carlos? A gente não vai deixar você brincar mais com a gente". Saí à rua levando meu brinquedinho, e depois de gozá-los demais, cada um pegou na caveira, admirando a novidade. Acabei contando como era antigamente e um disse. "Devia ser bem legal no seu tempo, né Carlos?". Respondi. "Era sim. Mas o tempo de vocês também é legal. Todas as épocas são legais, a gente é que tem que fazer valer. Só têm que saber aproveitar, brincar muito, estudar, porque tudo isso passa e não volta mais. Respeitar os colegas e os mais velhos". Achei mais legal que o novinho, que realmente fez xixi na calça, estava com a caveira na mão e perguntou. "Posso levar pra mim?". Não só ele, mas todos, levaram muito mais que o objeto da caveira, levaram nas mentes a visualização de um tempo que talvez gostariam de ter vivido. Só espero que tenham aproveitado seu próprio tempo.