ESCREVER É DIVINO!

ESCREVER É DIVINO!
BONS TEMPOS EM QUE A GENTE PODIA VOAR. ERA MUITO BOM SER PASSARINHO.

CAMINHOS DE UM POETA

CAMINHOS DE UM POETA
Como é bom, rejuvenescedor e incentivador para o poeta, poder olhar para trás e ver toda a sua caminhada literária, lembrar das dificuldades, dos incentivos e da falta deles, da solidão de ser poeta e do diferencial que é ser poeta. Olhar para trás e ver tudo que semeou, ver uma estrada florida de poesias, e dizer: VALEU A PENA! O poeta vai vivendo, ponteando, oscilando, e nem se dá conta da bela estrada que escreveu. Talvez ele não tenha tempo porque o horizonte o chama, e o seu norte é... escrever... escrever... escrever. Olho hoje para trás... não foi fácil, mas também ninguém disse que seria. E eu sabia que não seria, ser poeta não é fácil, embora seja lindo. Contemplo a estrada que eu fiz, e digo com orgulho quase narcisista: Puxa... como é linda minha estrada!

terça-feira, 19 de maio de 2009

COMO SE FAZ UM PAÍS?



Dona Jandira, era alta, não gorda, mas forte. Quase negra, dizia que era descendente de escravos e se orgulhava disso. Tinha cabelo pretinho, liso e curto. Todos os dias ela punha uma frase bonita no alto do quadro. Suas preferidas eram. "Educai a criança e não precisarás punir o homem". E a outra, de Monteiro Lobato. "Um país se faz com homens e livros".
Escola Estadual Costa Lacerda. Onde passei quase todo meu primário e onde escrevi meu primeiro texto poético. Eu nem sabia o que era isso, mas fiz. A professora iniciou um conto e mandou que os alunos o terminassem, cada um conforme sua imaginação. Eu completei usando minha mãe como tema. Quem quiser conferir leia em "Pérolas de minha infância- Iniciação poética", postado no blog em 17/julho/2008, mas a história não acabou aí, porém se fosse contar tudo, ficaria demasiadamente grande. O melhor da sala, ia concorrer com toda a escola e o prêmio era uma caneta de prata, cravejada de pedrinhas brilhantes. Sei lá se eram brilhantes de verdade, mas era linda sim, reluzente, de uma prata muito bem trabalhada. Eu ganhei. Fiquei tão metido que não deixei quase ninguém pegar. Nem mesmo a usei, guardei em casa dentro da caixinha.
Havia um menino bonito, loiro, riquinho, chamado Serginho, esse sim, era o nota dez da sala, que não gostava de mim de jeito nenhum e eu não sabia o porquê. Mas nessa ele perdeu e talvez isso tenha acirrado mais essa implicância comigo. O pior que eu e Francisco, tínhamos uma brincadeira de trocar os cadernos de todos no recreio. Um dia nós não fizemos isso, mas o tal Serginho deu falta de sua caneta de seis cores que gostava de exibir. Pronto. A caneta apareceu justo debaixo de minha carteira. Maior confusão, me chamou de ladrão, eu quis bater nele, até que Dona Jandira interveio. Só não fiquei de castigo até as treze horas, porque a professora garantiu à diretora, mulher carrancuda, mal humorada, que eu não havia pego nada, que era só um mal entendido. Mas acho que a diretora só queria dar uma satisfação à mãe do menino, que reclamava muito e exigia punição. Afinal, eram amigas. Isso foi em setembro, me lembro que era primavera, pois saíamos à ruas pedindo donativos para a festa da rainha.
Chegando o fim do ano, ia ter o amigo oculto e me arrependi de ter entrado. Meu pai havia morrido há poucos meses, a pensão custara a sair e as coisas apertaram em casa. Não tive coragem de pedir dinheiro à minha mãe. Foram passando os dias e eu ficando apertado, principalmente porque havia tirado para amigo oculto, justamente... Serginho. Tive uma idéia que em princípio me doeu um pouco, mas era a solução. Resolvi dar minha caneta. Fui nas gavetas de minhas irmãs que sempre guardavam papéis de presente e fiz um belo embrulho.
No dia, quando chegou minha vez, falei no centro da sala. "Meu amigo oculto, na verdade não é muito meu amigo...". Ia dizer mais coisas, de reconciliação, mas a turma não deixou, foram logo abafando, adivinhando. "Já sei, já sei. É o Serginho". Pronto, entreguei, ele nem me olhou.
Pouco depois em meio aos comes e bebes, Dona Jandira cortando o bolo em sua mesa me chamou, mandou que eu sentasse na cadeira e perguntou. "Quer um pedaço de bolo?". Disse logo que sim, eu adorava bolo. Ela cortou um pedação, me deu, ajoelhando à minha frente. Meus pés mal tocavam o chão. Lembro direitinho. Apoiou as duas mãos em minhas pernas, me olhou fixo por muitos segundos e perguntou já sabendo a resposta. "Por que você deu sua caneta?". Com a boca cheia, terminei de engolir um pedaço e respondi com naturalidade de criança. "Porque eu não tinha nada para dar". Ela pôs a mão no coração. "Ai, meu Deus, não me diga uma coisa dessa, menino. Não devia ter feito isso. A caneta era seu prêmio. Devia ter me falado, eu dava o dinheiro para você comprar o presente". Inocente, respondi de novo. "Ah, 'fessora. A caneta não importa. Importante é que eu tirei primeiro lugar, ganhei os pontos, isso ninguém tira de mim". Ela balançou a cabeça negativamente. "Importa sim. Claro que importa. Vou falar com o Serginho para devolver e eu dou a ele um presente". Arregalei os olhos e disse. "Não, 'fessora. Se a senhora fizer isso, aí mesmo que vou morrer de vergonha". Ela abaixou a cabeça por um tempo, me olhou de novo, apertou minha bochecha e concordou. "Melhor não mesmo. Deixe como está. Devia ter falado pra tia, meu filho. De qualquer forma foi uma bela atitude a sua. Demonstrou compromisso. Agora vá brincar, mas antes dá um beijo na tia." Disse pra ela levando a mão à boca. "Mas a senhora vai ficar com rosto sujo de bolo". Ela segurou minha mão. "Limpa não. Quero sujo de bolo mesmo, porque quero um beijinho bem doce". Beijei-a e quando saía, ainda a ouvi dizer. "Esses meninos me matam do coração".
Daí a três dias seria a entrega dos boletins e a despedida do ano.
As professoras gostavam de no final do boletim, escrever uma observação, uma mensagem ao aluno. No meu ela escreveu assim:
"Carlinhos. Nunca se esqueça de sua tia Jandira que amou muito a todos vocês, mas entre todos, você foi o mais doce. Que Deus ilumine sempre seu caminho para continuar sendo esse garoto de belas atitudes. É de cedo que se conhece os grandes homens. Parabéns". Eu não sabia direito o que queria dizer, mas se veio acompanhado de "parabéns", era coisa boa. Os coleguinhas gostavam de ver os boletins dos outros para saberem as notas. Eu vi de uns cinco ou seis, não exatamente pela nota, mas pelo que estava escrito. Ela escreveu igual em todos, menos no meu. No caminho de volta para casa, li para minha mãe e perguntei. “É coisa boa, né mãe?". "Claro, com certeza meu filho. Mamãe fica muito feliz", respondeu. Já bem longe, olhei para trás e tive a última visão da escola. Me deu uma vontade de voltar lá e perguntar ao Serginho por que ele não gostava de mim. Mas minha mãe estava com pressa. Quem sabe um dia. A vida sempre me deu uma segunda chance. Ou terá sido eu que sempre dei à vida uma segunda chance?
Há alguns anos voltei lá. A escola não existe mais, hoje funciona um clube de lazer. Como desculpa de ser um possível futuro sócio, pedi para entrar e " conhecer". Onde era minha sala, virou escritório. Onde era o grande pátio, tem várias quadras. Fui até o centro, fechei os olhos e pude ver... o sorriso farto e generoso de Dona Jandira, me olhando o tempo todo, com o rosto sujo de bolo, até o fim da festa. Agora entendo por que ela não limpou o rosto. Acho que queria que aquela imagem ficasse na minha retina. Ouvi também a gritaria dos meninos no recreio. Ecos de uma infância gostosa, quase sempre árdua, mas também divertida... porque eu fiz acontecer. Não sei por quê fecham escolas. Nenhuma pretensão de achar que sou um grande homem, mas sempre me pautei nos bons exemplos, e Dona Jandira, com certeza foi um deles. Vou emendar com todo respeito, a frase do grande mestre. "Um país se faz com homens e livros"... e professoras.

13 comentários:

Sonia Schmorantz disse...

Um país se faz com educação, esta é a conclusão, um excelente texto.
abraços

ARMANDO MAYNARD disse...

Carlos, você me emocionou com essa postagem. Uma professora inteligente e sensível, somados a bons exemplos, transformaram suas recordações em um belo texto, parabéns. Um abraço, Armando.

Leonor Varela disse...

No vendaval da Vida
Ter novo horizonte
Beber na doce fonte
Ver o nascer do sol
Limpar meu coração
Pegar um girassol
Ofertar aos meus amigos
Reviver a esperança
Feliz como uma criança
Vivendo essa emoção.
um beijo

Leonor Varela disse...

"E aprendemos que realmente podemos aguentar,
Que somos realmente fortes,
Que valemos realmente a pena,
E aprendemos e aprendemos"

Sim, mas não sem ajuda de amigos, sem dias de sol!
Viver e aprender.
beijinho
obrigado pela visita voltarei sempre sim meu amigo

~*Rebeca*~ disse...

Carlos,

Sinceramente, fiquei emocionada com seu texto. Segurei em alguns momentos as lágrimas... você além de tudo vai na nossa alma e mexe com um lado menino, um lado infantil, um lado puro. Parabéns pelo texto e sempre achei essa frase do Monteiro Lobato fantástica. Já que você mudou a frase, vou mudar também:

"Um país se faz com homens e livros..." e com homens que escrevem como você.

Ah, eu não desgrudo do Jota Cê por nada... é brigando e se enfiando mais ainda nesse amor que me domina.

Que seu final de semana seja maravilhoso.

Rebeca

-

(CARLOS - MENINO BEIJA - FLOR) disse...

obrigado a todos. Alguns respondi nos blogs. A você,Rebeca. Eu que fiquei emocionado com seu comentário. Obrigado por me considerar assim. Sobre o jeito de ternur, quase infantil, é uma mistura de cecília Meireles com Monteiro Lobato. Acho que saiu um Carlos, doce e ao mesmo tempo intenso. Monteiro Lobato também disse: "De tanto escrever para crianças, simplifiquei-me.". Lindo. né? E quanto a você, é isso aí, ame seu homem sim da mesma forma, doce e intensamente. Senão a vida não vale a pena.Grande beijo pra você. Apareça mais vezes, é um prazer, você é muito simpática

lili laranjo disse...

CARLOs
Deixo com carinho...



Africa sempre


Africa
África minha vida
Que entra
No meu coração…
Porque…
Para mim África
É saudade
Saudade grande…
E ao olhar…
Apenas a “foto”
E ver….
No pequeno papel…
Uma recordação…
O meu coração
Bate, bate forte…
Quer sair…
Dentro do peito…
Porque tu…
Africa…
Tens o feitiço
Que mais ninguém…
Nunca terá!...




Lili Laranjo

Sonia Schmorantz disse...

Tenho amigos que não sabem o quanto são meus amigos. Não percebem o amor que lhes devoto e a absoluta necessidade que tenho deles.

A amizade é um sentimento mais nobre do que o amor, eis que permite que o objeto dela se divida em outros afetos, enquanto o amor tem intrínseco o ciúme, que não admite a rivalidade. E eu poderia suportar, embora não sem dor, que tivessem morrido todos os meus amores, mas enlouqueceria se morressem todos os meus amigos! Até mesmo aqueles que não percebem o quanto são meus amigos e o quanto minha vida depende de suas existências...

A alguns deles não procuro, basta-me saber que eles existem. Esta mera condição me encoraja a seguir em frente pela vida. Mas, porque não os procuro com assiduidade, não posso lhes dizer o quanto gosto deles. Eles não iriam acreditar.

Muitos deles estão lendo esta crônica e não sabem que estão incluídos na sagrada relação de meus amigos. Mas é delicioso que eu saiba e sinta que os adoro, embora não declare e não os procure. E às vezes, quando os procuro, noto que eles não tem noção de como me são necessários, de como são indispensáveis ao meu equilíbrio vital, porque eles fazem parte do mundo que eu, tremulamente, construí e se tornaram alicerces do meu encanto pela vida.

Se um deles morrer, eu ficarei torto para um lado. Se todos eles morrerem, eu desabo! Por isso é que, sem que eles saibam, eu rezo pela vida deles. E me envergonho, porque essa minha prece é, em síntese, dirigida ao meu bem estar. Ela é, talvez, fruto do meu egoísmo.

Por vezes, mergulho em pensamentos sobre alguns deles. Quando viajo e fico diante de lugares maravilhosos, cai-me alguma lágrima por não estarem junto de mim, compartilhando daquele prazer...

Se alguma coisa me consome e me envelhece é que a roda furiosa da vida não me permite ter sempre ao meu lado, morando comigo, andando comigo, falando comigo, vivendo comigo, todos os meus amigos, e, principalmente os que só desconfiam ou talvez nunca vão saber que são meus amigos!

Autor: Paulo Santana

Um lindo final de semana!
Abraço

Jéssica Lima disse...

O nosso país precisa de mais Jandiras por ai, chega dos serginhos da vida. Como sempre adoro vir aqui, aprendo um pouquinho mais, e me emociono sempre!
Queria me desculpar pela demora, estive um pouco ausente.. e não tive tempo de responder seu ultimo comentário sobre o mundo travesti, e concordo com sua percepcão.. "se o mundo se encontra nessa realidade hoje.. é culpa todinha do próprio homem."
Beijos, boa noite..

EDUARDO POISL disse...

A Amizade é...
O mais nobre dos sentimentos,
Cresce à sombra do desinteresse,
Nutre-se brindando-se e floresce
a cada dia com a compreensão.

Seu lugar está junto ao amor
Porque ela é também amor.
Somente os honestos podem
ter amigos, porque à amizade,
o mais leve dos cálculos a fere.

Como é um bem reservado aos
eleitos, é o sentimento mais
incompreendido e o pior interpretado.
Não admite sombras nem fingimentos,
rusticidade nem renúncias.

Exige no entanto sacrifício e coragem,
compreensão e verdade,
VERDADE! acima de todas as coisas.

Com as pequenas coisas
do dia a dia
cresce nossa amizade.
Desejo que sempre seja assim.

(Desconhecido)


Te desejo um final de semana com muitos amigos,amor e paz
Abraços do amigo Eduardo Poisl

Anônimo disse...

Carlos, o meu professor!

Deusa Odoyá disse...

Olá meu amigo sumido!!!
Quanta saudades.
Olha vc. nos deu um belo exemplo de educação e amor ao próximo, mesmo não sendo seu amigo, o parbenizou com a sua caneta, que foi ganha no seu concurso, que tanto almejou.
Parabéns a sua professora uma mulher séria , boa e iluminada.
Um belo e lindo texto.
Uma semana de muita paz, amor e luz.
Beijinhos doces, meu amigo.

Regina Coeli.

Parapeito disse...

è bem verdade ...Que melhor seria o ensino se houvessem assim mais professoras...decerto todos teriam mais gosto em aprender...
Em Portugal...o ensino vai mal...
a ver onde tudo isto vai levar a nossa juventude...Pois um país em educação é como um país sem pão...
Um abraço*