Esse texto é quase um dicionário sobre algumas
expressões que minha mãe usava, algumas criadas por ela mesma, tem
também algumas passagens interessantes e algumas particularidades que
só a Dona Sebastiana tinha. Divirtam-se:
- ESPECULA – Vem do verbo
especular, claro, mas ela inventou esse substantivo. Quando ela estava
fazendo alguma coisa e a gente perguntava: “Que é isso, mãe?”. Ela
respondia: “É especula!”. Era um jeito de ela dizer “não é da sua
conta”, um jeito de colocar fim na conversa, não gostava de gente
curiosa.
- ESTRUPÍCIO- Essa já é uma palavra conhecida, ela usava
quando queria fazer algo ou passar, e a gente estava na frente: “Sai
daí, estrupício”. Mas não falava brava, falava rindo.
- ÓTIMO DE
BÃO- Quando ela queria expressar que algo ficou muito bom, dizia assim,
por exemplo: “ Esse macarrão ficou ‘ótimo de bão’.
- PRA FRENTE – O
mesmo que enxerido, inconveniente. Dizia: “Larga de ser pra frente”. Ou
quando a gente ia à alguma festa: “Espera te servirem, não vá ser um
‘pra frente’ pra passar vergonha”. Usava também: Pra frente igual bico
de sapato
- O CARLOS É UM MENINO BÃO, MAS É ENJOAAAADO. TEM QUE TER
PACIÊNCIA COM ELE. Um dia reclamei: Mãe, a senhora não pode ficar
falando isso de mim, principalmente com minhas namoradas, tá me
atrapalhando”. E ela: “Eu tô falando a verdade. Eu sou de falar a
verdade”. Até que eu concordo com ela rs rs. A mãe sabe o que fala, né?
- BUBIÇA- O mesmo que bobice, bobeira, bobagem.
- BOCHECHUDO. Eu mesmo he he. Quando eu fazia alguma raivinha: “Ah, se
eu pegar esse bochechudo”. Eu gostava disso, às vezes fazia até um pouco
por querer, só para ouvir isso... mas à meia distância para ter tempo
de correr. Embora eu só tenha apanhado uma vez.
- MENTIRA – Não
gostava de mentira nem de brincadeirinha. Dizia: “Mentira não tem esse
negócio de tamanho, não tem mentira pequena e mentira grande. Mentira é
mentira e pronto”.
- COCHICHO- Detestava quando a gente cochichava. “Quem cochicha tá tramando coisa errada”.
- QUANDO FICOU VIÚVA- Poucos meses após falecimento de meu pai, um
senhor já velho começou assediá-la. Lembro até hoje ela contando que deu
um “pra trás” nele: “O senhor me respeite. Acha que eu tô caçando caco
de véio?”. E mais: “Deixa ele vir aqui na minha porta que vou tacar
água quente na cara dele. Eu tenho uma raiva de véio safado”.
PERSONALIDADE- Minha mãe era um doce, mas tinha personalidade forte, só
fazia o que queria. Quando a gente insistia, tentando impor alguma
coisa, dizia: “Quem mandava em mim era meu pai, e ele já morreu”.
SANFONA –Meu pai sempre levava os amigos lá em casa pra tocar sanfona,
comer e beber. Ela até gostava até porque quem fazia os tira-gostos era
ele mesmo, ficava só vasilhame para lavar depois. Era divertido. Mas
quando ela não queria, não tinha jeito. Ele dizendo: “Sebastiana, vou
trazer o pessoal pra tocar aqui no fim de semana”. Ele de dedo em riste:
“Ah não, não quero saber daqueles véios cachaceiros aqui não”. E não
iam mesmo.
NÃO VOU BEIJAR NINGUÉM- Quando a gente fazia pirraça e
não queria comer, ela falava assim, que é o mesmo que , “ não vou adular
ninguém, não vou insistir”. E completava: “Quer quer , não quer, tem
quem quer”.
CONTAR CAUSOS- Adorava contar causos antigos lá da roça,
e era eu quem mais pedia pra ela contar. Um dia pedi: Lembra aquele,
mãe, de como a senhora tomou meu pai da outra moça. Ela: “Eu não tomei
não, não fui eu que fui atrás dele. As ‘bestonas’ (as outras moças )
ficavam andando atrás dele, eu não.
- PRA FECHAR COM CHAVE DE OURO –
FUNDIAR- Ela nunca falava palavrão, até nos repreendia, ainda que fosse
um palavrão leve... mas um dia ela falou. A situação em casa não estava
muito boa, era de tarde, a gente tomando café na mesa, ela disse que ia
comprar uma coisa pra casa ( não lembro o quê), e quando um de nós
disse: “Mas é caro, mãe. Vai apertar”. Ela respondeu: “Já tá tudo
fudido mesmo... vamo acabar de ‘fundiar ‘ tudo. Foi o dia que mais ri
na vida, tive que deitar pra rir.
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Por hoje é só, se eu lembrar mais, e com certeza vai ter, eu conto.
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( imagem behance.net )